500 DIAS COM ELA, AS ESTRELAS E O PONTILHISMO
“500 dias com ela” (“500 days of
Summer”) é um filme que foge aos padrões da comédia romântica comum. Brinca com
a expectativa e a realidade, e nos entrega uma história doce, sensível e inovadora.
O filme é contado em uma cronologia inusitada, que se alterna com a memória do protagonista-narrador. Ora se recordando apenas dos bons momentos, ora dos maus, como na vida.
Como dito já nas primeiras cenas,
é um filme em que um rapaz conhece uma moça, mas em que o rapaz não fica com a
moça. Conta os 500 dias entre Tom conhecer Summer e seu relacionamento
finalmente chegar ao final. Tem momentos tristes, outros felizes, mas principalmente
tem momentos de vida. Contrasta as situações que queremos viver com aquelas que
efetivamente vivemos, de uma forma leve e até divertida.
Muitos são os momentos relacionáveis
por nós, aqueles em que nos vemos ali na tela, desesperados de amor como Tom,
ou querendo muito, mesmo sabendo que não está totalmente certo em nosso coração,
como Summer. A cena da festa em que há a sobreposição entre expectativa e
realidade é impagável.
Assisti este filme encantador e
fui conduzida pela história por este narrador-não-confiável que primeiramente
nos faz amar Summer, a perfeita garota dos sonhos, só para nos faz odiá-la, num
vai e vem que retrata a briga sentimental interna de Tom.
Somos confrontados com
expectativas, projeções e realidade, coisas que quase nunca se correspondem.
Tom via Summer de uma forma que
não correspondia à realidade, ao menos não à imagem que ele fez dela.
Isto me fez pensar nas estrelas
do céu. Li recentemente uma passagem que cabe bem aqui:
“Cada estrela – e cada homem – tem seu espaço
e suas características especiais. Existem estrelas verdes, amarelas, azuis,
brancas; existem cometas, meteoros e meteoritos, nebulosas e anéis. Aquilo que
daqui de baixo parece uma porção de pontinhos iguais, na verdade são milhões de
coisas diferentes, espalhadas por um espaço além da compreensão humana.”
Este trecho, retirado do incrível
“O Diário de um Mago”, de Paulo Coelho, para mim dialoga diretamente com este
filme.
Tom, ao conhecer Summer, a vê
como uma bela noite estrelada. Linda, brilhante, encantadora. Porém, aos poucos
passa a conhecê-la de verdade e também a se conhecer melhor, pois todo
relacionamento gera uma troca, e vai conhecendo as muitas cores e camadas que compõem
cada um deles.
Como adoro fazer conexões, minha
cabeça imediatamente voou para o movimento do pontilhismo. Para quem não sabe,
é uma técnica de pintura em que não são dadas largas pinceladas, mas são feitos
pequenos pontos a fim de se formar a obra final. De longe, vemos uma cena
íntegra, completa. Ao se chegar mais perto, verificamos que na realidade a obra
é feita de minúsculas partículas, diferentes uma das outras, que se juntam e
formam aquela linda obra de arte.
Georges Seurat |
A técnica foi criada na França,
em meados do século XI e consagrada por pintores como Georges Seurat e Paul
Signac, influenciando pintores como Van Gogh, Henri Matisse e Pablo Picasso. É impressionante
e muito bonita, justamente pela dificuldade e habilidade do pintor em através de
pequenos gestos criar obras majestosas.
Paul Signac |
Assim é o pontilhismo. Assim são as
estrelas no céu. E também assim é cada um de nós. Minúsculas partículas de
pensamentos, emoções, ações, frustrações, medos, projeções, que se fundem e nos
tornam quem somos. Complexos e completos.
Relacionar-se é encontrar aquele
outro ser cujos pontinhos melhor se conectem aos nossos. Podem ser totalmente
diferentes – e normalmente o são. E não adianta forçar. Como em uma verdadeira
obra de arte, a perfeição está nos detalhes. No que faz de cada um especial.
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